
É estranho voltar à cidade onde já se viveu durante uns tempos. A cidade é estranhamente familiar, familiar porque se conhece, dá para andar sem mapa, estranha porque já não se faz parte dela e a orientação não é a mesma. Não se quer fazer os percursos turísticos, porque não se quer aceitar a categoria de turista, ou “porque já se conhece”, mas também se quer ir aqui e ali, porque é novo, ou porque está diferente.
Deambulações à parte, Londres está cada vez mais caótica, mais cosmopolita, cheia de gente, cheia de cheiros, cheia de dinheiro, de grandes carros– ali não se vê cinquecenti – “quite fashion”, “quite crowded”, “quite arty”. A precariedade cada vez maior, em cada quarteirão há pelo menos dois ou três tipos a segurar num cartaz, que anuncia um restaurante ou uma casa de câmbio a 100 metros dali. São espanhóis, italianos, brasileiros, que passam o dia a segurar um cartaz. Estudam em part-time, e trabalham no que aparece. Os transportes cheios de cartazes e avisos sonoros de “security allerts”. O aeroporto paranóico com a segurança “only one bag for person”, “please don’t leave your belongings behind” e a moda do “caffe-latte”. Tive um momento de descoberta interior e percebi que fui abençoada no meu tempo de Erasmus, pois ainda não era uma viciada em cafeína, e que hoje seria difícil sobreviver nesta cidade sem um bom café.
Tive também outras epifanias, que não me vale muito a pena verbalizar.
Londres é me estranhamente familiar e sempre que lá vou, as ideias andam agitadas e o coração feito num oito. Os quilómetros de distância podem ajudar, mas também complicam e lembram as primeiras e as últimas linhas daquele poema maldito do Cesariny, “em todas as ruas te encontro, em todas as ruas te perco”.
1 comentário:
como te compreendo.... quando regressei a londres - depois de lá ter vivido 6 anos - uns anos mais tarde, a cidade pareceu-me estranhamente familiar. mas mais suja, mais cinzenta e mais triste. sai de londres com a certeza de que agora não iria para lá morar. quem sabe se daqui a mais 6 anos não regresse e tudo me pareça diferente. ao menos é uma cidade com essa capacidade incrível de mutação.
bom blog
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