segunda-feira, agosto 11, 2008

A descoberta matinal de uma nódoa negra e roxa no joelho esquerdo fruto do unknown, e o pensar que talvez a depilação para os poucos pelos de 2 mm não fosse má ideia (não, as minha pernas não são uma Floresta Negra ibérica, mas isto da praia quinzenal, não há maneira de as queimar e a aloirar os seres que insistem em continuar a crescer) já eram sinais. Mas estava-se com pressa, havia bancos a percorrer aqui por Campolide - não, não ia raptar ninguém, nem servir de refém, nem aderir à moda bairrista de passear pela agência visada, só para ver o que se passa por ali, se ainda há marca no chão -  um passaporte para levantar, sublinhar umas coisas, para depois ir ter com Preciosa Contraditória lá mais pela tardinha, para se ir até aquela esplanada fashion, que implica uma ginástica olímpica, pequenino pormenor para raparigas pouco ginasticadas mas com  muita elasticidade social, que isso também, faz bem à alma. 

Dizia, eram sinais. Deu-se corda às perninhas e alla que se faz tarde. Perde-se o 58 mesmo à frente do nariz, aguarda-se pelo próximo. E lá vem ele, com pouca vontade de se encostar à paragem, os passageiros que andem até ele, e passageira de trinta anos resolve dar um ar de passageira de setenta anos, e espalha-se ao comprido, torcendo o seu pézinho esquerdo numa elasticidade desconhecida, acho mesmo que fez a rotação pela Terra, por Marte ou Saturno, esfolando o joelho e solta-se um valente "Au!"  e um pequeno desabafo sentido e expressivo que não vou reproduzir, levanta-se não se sabe bem como, a coxear, entra-se sem muitas falas com ninguém, e sento-me no lugar dos reservados, dos velhinhos e dos acabados, num misto de dor e de vexame público, tão igual aquele que se sentia quando se era miúda, mas que se podia chorar à vontade, que com um beijinho da mãe e uma sombrinha de chocolate, a coisa passava. Consigo dar alegria ao estimado público do 58, que vai até ao Chiado empenhado em debater que poderia ter sido bem pior, ou que a vida pode-se ir num  minuto, e um colectivo de olhares macabros e curiosos contemplavam o  meu joelho esfolado e sangrento, à espera de uma qualquer reacção, que alguma coisa saísse de mim, para que pudessem continuar a traçar o diagnóstico. Para melhorar consideravelmente o quadro urbano desta coisa de ususfruir dos transportes colectivos, a principal mobilizadora da opinião pública do 58, sai na mesma paragem que eu, despede-se de mim com um "e coitadinha, está grávida e tudo!", e com "Deus que a ajude!", e eu demasiada concentrada na minha dor e na minha coxice, nem fui capaz de agradecer com alguma blasfémia. Caramba. E o joelho esfolado, a sangrar. Onde raio se trata de um joelho quando se anda por Lisboa? Farmácia? Pois, está bem, "mas tem que comprar um saco de água oxigenada e um pacote de algodão e isso do pé... bem, nós não somos médicos". Muito bem. Mais vale entrar no primeiro café que encontrar, fazer o meu ar mais desgraçado possível e pedir se têm alguma coisa com que possa desinfectar. E tinham. Mas o pé, coitadinho do pé, continuava a doer. E como raio conseguiria subir até ao Castelo? A Preciosa que me desculpe, mas eu cá acho que vou até às Urgências. 

E lá gastei o que tinha  num táxi que me levasse até ao hospital da minha residência. Ai, como é tão bom atravessar a cidade às cinco da tarde. O trânsito já está nervosinho e os condutores simpáticos e bem-dispostos. Chega-se ao tal hospital,  está em obras, para não destoar do contexto nacional. Não há macas, não há cadeiras de rodas, não há salas de recobro, portanto, junta-se tudo num só espaço. Ainda não sabia. Primeiro vou pagar a taxa moderadora, e depois dizem-me "Ah, a Inês tem aqui uma conta antiga de 2002, quando puder pagar, esteja à vontade". Com certeza, tomem lá 1€ pelo oxigénio. Já agora você também paga pelo oxigénio que usa todos os dias? Ah, ah, a Inês é engraçada. Aguarde só um bocadinho, que já a chamam. E lá se espera pela triagem. E pela triagem da triagem, onde se encontra um médico revoltado com o sistema que me diz que o raio-x tem estado avariado, por isso vai demorar, "como sempre". Volta-se para a sala de espera, a tal onde se partilha tudo, uma espécie de colectividade improvisada, com as macas, os doentes, os acompanhantes. Todos sabemos o que cada um tem. Para compor o cenário Wisemaninano entram alguns guardas prisionais com tipos algemados, "deve ter havido rixa na prisa", diz a líder da sala de espera. Um dos prisioneiros, que por acaso até ia de maca, senta-se, olhando para o público e diz  que está muito feliz por estar ali, de ver outras caras, e ri-se, ri-se, ri-se e desaparece para um dos gabinetes da triagem. Desconfio que foi atendido pelo médico revoltado, pois não voltei a ver nenhum dos dois. 
Ao fim de algum tempo, lá fui atendida. "Não partiu, só torceu", ainda assim mandam repouso e pé no ar durante uns dias, gelo e anti-inflamatório, e tarã, canadianas. "Canadianas? Não! Isso é que não!". Ai não mesmo. Prefiro o pé coxinho. 

And God, thank you again for another lovely monday! 

1 comentário:

trintinha disse...

Amiga, cada vez me convenço mais que os trinta só nos trazem destas coisas. Estou muito solidária contigo. Estou eu, as borbulhas e as constantes comichões da minha mais recente alergia sabe deus a quê, que me tornou num camarão da cabeça aos pés!!! Nós sofremos!!!